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Categoria de textos extraídos de fontes que serão citadas no corpo dos posts.

DING-DONG: A CIDADE CHAMA

Os textos deste blog costumam ser autorais e falar de amor. Desta vez, a autora não sou eu, contudo, o amor está presente. O amor pela cultura. É um manifesto. Um lindo texto de Clarisse Muller.

 Dizem que Érico Veríssimo, quando indagado sobre a cidade em que vivia, respondia com orgulho: sou de uma cidade que tem uma orquestra sinfônica. Já eu, Clarice Müller, nascida e criada nessa mesma cidade, respondo, com vergonha: sou de uma cidade que acolhe com festa um shopping, mas rejeita que sua sinfônica ali se instale; sou de uma cidade que por décadas aguarda a finalização de um teatro dedicado à sua maior cantora; sou de uma cidade que acabou, sem pestanejar, com o carnaval de rua, e jogou o que resta para os confins mais inabitados; sou de uma cidade que canta as façanhas do passado, mas desdenha a arte do presente; sou de uma cidade que impõe toque de recolher a seus habitantes. Sim, agora diversão e arte cumprem expediente de escritório. Agora a ordem é cineminha e cama, comida em casa, que na saída tá tudo fechado. Como a cabeça de quem nos governa. Fechar bares, isolar torcidas, logo, logo, cercar parques, isso lá é jeito de se administrar uma cidade??? Porém, como sociedade se faz fazendo, se os comerciantes, empregados, clientes, artistas, tutti la gente se juntarem, dá pra dar um basta nessa idiotice. Impor respeito, sabe como é? Não aceitar a muquiranagem como destino histórico, o sono como ideal de vida, o tédio como meio, a mediocridade como fim. Cidade-dormitório? Vão se catar! É preciso pensar e agir grande, transformar Porto Alegre num pólo irradiador de cultura, com o diferencial que um Village, uma Lapa trazem em prol da felicidade geral da nação, na falta de neve e chocolate amargo, claro. Não dá é pra dormir no ponto. Achar que, com o tempo, tudo se ajeita, se resolve. Ahã. Foi com toque de recolher que acabaram com o Bomfim, que só agora, mais de duas décadas passadas, lentamente ressurge. Quer ver esse filme de novo? É só cruzar os braços. Falando claro: estou incomodada, mas não vou me mudar, eu proponho é mudar. Junto contigo. Topa? Então compartilhemos, pois.
PS: NAO SOU CANDIDATA A NADA.

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Garrafas

Por Fabiano Rosa Tatsch

Junho, dia dos namorados, casamento na roça, santo casamenteiro…O embalo da valsa dos namorados soluçando de rir da cara de quem queria estar apaixonado. Culminando com isso o frio do inverno que instiga a boa companhia, o bom vinho, o olhar carinhoso, o deitar no colo, o abraçar com olhos, o amar com a pele, o delirar com o cheiro, o se entregar imóvel, em pensamento. De roupa. Sem roupa.

Sempre vivi esse mês assim… pelo menos desde que eu entendo como isso funciona, vivi assim… anestesiado a ponto de agarrar espinhos pra chegar mais perto das rosas, com um coração perto pra se escorar no meu, com alegrias depositadas em juras de amor, com esperanças enfeitadas com laços de presentes… Hoje não mais…

E agora, faço o que com os espinhos, se já nem vejo a beleza das rosas? Outrora li que devemos guardar amores na gaveta, para serem recriados nos momentos de maior solidão. Mas se procuro em todas as gavetas e os que encontro já gozam de outra vida, de outros amores, já publicam nossas músicas, já recriam nossas frases, já sonham os MEUS sonhos, já se enfeitam com MEUS ornamentos?? Hoje precisava de uma garrafa de amores. Pra beber no gargalo, tudo de uma vez, e deixar escorrer pelo corpo todo, e não soltar até que se tenha chegado ao fim…

E quando o fim chegar, ainda poder apreciar. Apreciar o fim que precede o começo. De um novo começo. E fazer isso com maestria. E sentir de novo o esquentar da alma, a soberania daquilo que mascara o senso crítico. E encher de amores outras garrafas…

Mas parece que o que me apontam são pequenos copos. Pela metade. Que já não matam minha sede. E a comparação é inevitável. Quem se contenta com o bom quando aprendeu o ótimo? Olhando pra trás cintilam as garrafas que foram tiradas sem que eu conseguisse beber tudo. Algumas quebradas com seu interior derramado. Outras que rolaram, foram jogadas pra longe, mas que permanecem com seu conteúdo intacto. Pronto para uma degustação mais madura. Seja nessa ou noutra vida.

E enquanto essa maturidade não chega e eu não posso gritar um amor, silencio. E continuo rabiscando traços do teu rosto. Mesmo que eu nem saiba que rosto tens. E nele almejar a entrega, sem recato. Sonhar a delicadeza sem pudores. E os amores das gavetas? Coloquei fora… Quero espaço para as novidades. Elas sim saberão me rejuvenescer e tirar o cheiro de mofo. Em cima das gavetas? Garrafas, juras de amor e laços de presentes. A espera de ti, que nem conheço… mas que fez eu me perder nesses tolos devaneios….