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O Estranho e A Outra Face do Estranho

Por Juliana Ramiro (25/06/2006)

O Estranho

Ouvi uma bela história, não sei se vou conseguir contá-la com o mesmo requinte e todos os detalhes que me foram apresentados. Tu sabes bem que minha memória não é das melhores, mas acredito que vais gostar.

Era uma dessas histórias de amor que falava de uma bela Deusa, de longos cabelos ruivos e ondulados, de olhar e sorriso doces e, ao mesmo tempo, maliciosos. Numa tarde escura e chuvosa, a Deusa fugiu com um estranho para um belo templo, não muito grande, adornado com a pureza do azul e, muito próxima a esse templo tinha uma fonte aquecida a borbulhar.

A Deus e o estranho se amaram de forma tão intensa que os detalhes lhes fogem a memória, que registrou apenas a grandiosa intensidade como as coisas aconteceram, a entrega e o prazer. Mas o tempo, inimigo de todos os amantes, correu muito depressa e, quando perceberam, já era hora da bela Deusa voltar a sua morada. Ela se fora e deixara o estranho só com suas recordações. Os belos olhos, o encarnado dos lábios e cabelos, a pureza alva da pele, o odor suave, o sabor, o calor, o amor.

Dizem que ela se entregou para saciar os desejos desse estranho, ao qual jurou seu amor. O que a Deusa não sabia, era que essa entrega era imprudente e que deixaria marcas profundas. Seu pobre amante, depois dessa tarde, vaga sozinho, sem rumo. Ele já não enxerga a beleza do mundo se não fora através dos olhos dela. Todos os seus sentidos estão confusos, todas as sensações carregam turbilhões de lembranças e novos desejos.

Claro, não sou um bom contador de histórias e devo ter perdido informações importantes da transcrição original para esta, mas espero que consiga passar a essência e a beleza dessa história.

A Outra Face do Estranho

Também não sou uma boa contadora de histórias, mas vou tentar, nas poucas linhas que se seguem, recontar a tão linda história de amor entre a Deusa dos cabelos ruivos e o Estranho, acrescentando detalhes que ouvi da mesma história e que, de forma muito especial, marcaram minha alma.

Sem dúvidas é uma linda história, e até arriscaria dizer de conto de fadas, marcada pela pós e mútua melancolia. Assim como o Estranho sozinho, vaga sem rumo e precisa dos olhos da Deusa para enxergar as belezas do mundo, depois de tão significativa tarde, ela, tão linda Deusa de cabelos ruivos, não imagina mais a felicidade se não no reencontro com tão amado Estranho. Não consegue viver sem ter a certeza do presente e, por mais que saiba que, de forma especial, marcara esse homem, o medo de não tê-lo pelo tempo que dure esse amor é algo forte, atormentador.

Sofre o Estranho, sofre a Deusa. Tudo depois dessa tarde parece pesar na certeza, tudo depois desse tempo parece ser pouco, porém intenso, fraco porém verdadeiro. Sabe-se que até os dias de hoje, eles não conseguiram se reencontrar em tão celestial presença. Dizem que a Deusa não é mais a mesma, que por mais que o exterior continue intacto, algo dentro dela mudou fundo. Ela anda longe. Talvez ao encontro daquele Estranho, que chegou meio na sorte, no acaso, no destino.

E aqui, o destino, é o único a poder explicar tão fulgorosa história, só através dele ela ganhou início, meio e quem sabe, um dia, por obra somente do destino, ganhe um fim. Ninguém melhor que o destino para contar essa história, ninguém melhor que o criador para falar da criatura. Assim, fica no ar, no coração da Deusa e do Estranho a angustia do reencontro, e ainda, a dor de não saber como tudo acabará.

Obrigada ao meu grande amigo Lenir Bartnik por estar sempre presente na minha vida e me ajudar a escrever essa história..

De mudança

Por Juliana Ramiro

Faz tempo que ando longe do blog por que na minha vida parece que tudo acontece exatamente ao mesmo tempo. É final de semestre, estou cheia de atividades por fazer, coisas novas no trabalho, um freela por terminar, um carro para negociar, um apartamento novo aguardando minha mudança e toda a arrumação pós-ela. É luz, é internet, é sofá, é cozinha por vir, roupeiro de já chegou, tomadas por instalar, tudo provisoriamente aguardando por mim.

No meu último banho na casa antiga, enquanto me secava e passava o único creme que ficou de fora das malas, vendo pela porta aberta a casa vazia, comecei a pensar nos significados de uma mudança. Quando a gente se muda opta por algo novo, opta por deixar coisas pra trás. E eu deixei.

Meu apartamento antigo foi minha primeira mudança, a única casa que tive em Porto Alegre. E nele recebi pessoas que nem falo mais, e amigos que me ajudaram na primeira mudança e até hoje estão na minha vida. Recebi postais, dos que foram viajar e contas, preço das minhas conquistas. Nele pude entender o valor de se ter liberdade, e apreciar tal condição.

Na minha antiga casa aprendi a lavar roupas, consertar canos, instalar spots de luz. Aprendi a fazer estoque de papel higiênico, a limpar a geladeira, e a desenvolver paciência com os vizinhos. Naquela casa deixei lembranças. As visitas, os carinhos, os choros, as alegrias, os muitos trabalhos.

Já vestida, após meu último banho, vou até o quarto, agora vazio, e vejo que o que dele sobrou foi a janela e a árvore, que descobri há pouco, mas que aprendi a apreciar. Nesse momento pensei que deveria sentir saudade. Não senti.

As pessoas que falo me desejam felicidade na casa nova, que essa conquista seja para minha alegria, meu crescimento. E mesmo com tudo que deixo para trás não consigo me imaginar infeliz, seja aqui ou em qualquer lugar.

Não sei sentir saudade do passado, acho que a cada dia a vida fica melhor, o sol se abre mais brilhante para mim. O passado não me dá saudade, sou apaixonada pelo meu presente. E por escolha minha, o futuro será melhor, para que eu não precise sentir saudade do que se foi.

Eu vou ser feliz aqui, na minha casa, essa foi a escolha que fiz. Onde estiver a felicidade estará comigo, a carrego entre as minhas malas..

O preço de ser diferente

Por Juliana Ramiro

Todo pai deveria se orgulhar de ter um filho diferente. Na vida, não é o que acontece. O diferente sofre, não é compreendido. Há uma guerra de forças entre pais e filhos diferentes. Os pais tentando fazer os filhos mais iguais, os filhos tentando fazer com que os pais valorizem sua diferença.

No trabalho o diferente é reconhecido. Na faculdade, também. O diferente é aquele que os amigos elogiam o empenho, a força, a determinação. O diferente é aquele que é pego sempre de exemplo de luta, de espelho. Até os pais de filhos comuns usam os diferentes para estimular seus filhos normais. Só mesmo o pai do diferente não é capaz de aceitá-lo.

Eu sou diferente. Eu não usei drogas na adolescência para ser rebelde. Não andei com grupos barra pesada. Não fui mal na escola. Não repeti de ano. Não matei aula. Não fiz 10 anos de pré-vestibular. Não troquei de curso na faculdade, por indecisão. Sempre soube o que queria. Não rodei em nenhuma cadeira. Não usei roupas indecentes. Não fui a sabonete da cidade. Não namorei caras sem futuro. Não transei com um professor no ensino médio. Não matei aula. Não peguei o carro sem pedir. Não aprendi a dirigir antes dos 18. Não engravidei com 18. Não completei 30 anos morando e sendo sustentada por meus pais. Não fiz escolhas cômodas. Não culpei meus pais de nada. Não fiz terapia.

Hoje, com 22 anos de idade, muitas pessoas me elogiam pelas escolhas que fiz, pelas dificuldades que passei e passo, por onde cheguei. Muitas pessoas reconhecem meu esforço e minha diferença como algo bom. Já ouvi muito “é difícil encontrar alguém com a tua idade e tua maturidade, tuas conquistas”. Estes elogios e apoio só não vem de quem eu mais queria.

Este é o preço de ser diferente. Viver esperando compreensão de quem passou 22 e vai passar outros tantos tentando me colocar na forma do comum..