Arquivo da categoria: Autoria própria

Categoria de textos escritos pela autora do blog.

Em doces guerras frias

Por Juliana Ramiro

“O nosso amor sumindo
Entre partir, ficar
Entre o norte, o sul
Cruzando sobre os raios
Antenas de TV
Porque você me olha
Se você não me vê
Sobre os oceanos
Em doces guerras frias
Não deixa anoitecer
Não deixa escurecer
O Nosso dia”

Cruzando raios. Estou há dias com essa música na cabeça. Ninguém me agüenta mais. A canção é velha, de um cantor que poucos gostam e foi tema de novela das 20h. Assim, todo mundo conhece, pouca gente curte. A letra, num primeiro momento, não me disse nada, só hoje descobri por que ficou tão impregnada nos meus pensamentos. Ela serviria para inspirar algo que preciso por pra fora, cuspir mesmo.

Pior do que o amor que se vai é o gosto amargo e o cheiro azedo que fica. E esse cheiro fica impregnado na casa, na roupa, na pele, por tudo. E a gente tenta um cheiro melhor, um cheiro puro, mas o passado é tão forte, que nos bloqueia as vias, talvez as veias.

E mesmo um beijo doce, talvez o beijo mais doce que possa existir não é capaz de tirar por completo o amargo da boca. Eiii, não estou falando de amor. O amor é bom e já foi embora, o que sobrou foi o gosto ruim, que não vai, mas já vai tarde.

O cheiro azedo se mistura com o cheiro de cola. A gente cola os cacos, mas o cheiro fica. E a nossa própria cola se mistura com o cheiro de tinta, da tinta que a gente rabisca o novo futuro. E risca e rabisca.

Quem dissolve tudo isso? O tempo. Ele alivia o cheiro, amacia o gosto, torna a tinta fresca seca. Acalma o pensamento. Fixa os rabiscos na história, estabelece cada lugar. Dá vida. Traz vida. Devolve vida. V-I-D-A-!.

Bailarina e Soldado de Chumbo

Por Juliana Ramiro

Fazia tempo que não participava de um Sarau. Aliás, fui a vário como ouvinte. Só participei num. E lembro até hoje, nele descobri que, mesmo tímida, ter a atenção dos outros era algo que me atraía. Meu assunto não é o Sarau, mas uma das conversas que rolaram nele – o Teatro Mágico. Banda, espetáculo, show, não sei como descrever o que é o Teatro, talvez um teatro mesmo. Enfim, as letras são ótimas e uma delas, em especial, ficou martelando minha cabeça a semana inteira. Entre uma atividade e outra, eis que surgia a história da Bailaria e do seu par, o Soldado de Chumbo, na minha boca. Não tinha como a música não virar tema aqui.

“De repente toda mágica se acabou
E na nossa casinha apertada
Está faltando graça e está sobrando espaço
Estou sobrando num sobrado sem ventilador”

Tudo que sobra num relacionamento é ruim. Tudo que falta também. Estar sobrando ou faltando é sinal de que não está na medida certa, não existe um equilíbrio. Um copo vazio muitas vezes não mata a sede. Um copo muito cheio transborda, derrama, acaba molhando o chão.

Os mais materialistas vão dizer que dinheiro sobrando é bom, não é, primeiro por que, na verdade, nunca sobra. O que não se gasta num mês se gasta no outro, investe-se. Agora me diz: Tem como investir amor para não sobrar? O que não conseguimos amar neste mês vamos amar no próximo, e tudo bem? Ou se faltou amor. Até quando um vai esperar o outro ressarci-lo dessa falta?

“Vai dizer que nossas preces não alcançaram o céu?
Coração, que ainda vem me perguntar o que aconteceu
Conta se seu rosto por acaso ainda tem o gosto meu”

O difícil é aceitar que não existe o equilíbrio, é pensar que tem coisa de mais ou coisa de menos naquilo que era para tão perfeito. O difícil é entender que não é a gente que está querendo demais, é que está faltando mesmo. Nessas horas a cabeça tenta mostrar o real, no entanto o coração da Bailarina segue tentando se iludir. O difícil é entender que a Bailaria do Soldado de Chumbo precisa seguir sem ele, e que isso é melhor para os dois. O difícil é:

“Nossa casinha vazia
Parece pequena sem o teu balé
Sem teu café requentado
Soldado de Chumbo não fica de pé”

E, mesmo assim, seguir, esperando que o tempo ponha, mais uma vez, tudo no seu devido lugar..

Não é fácil viver sem te ter

Por Juliana Ramiro

Antes de desenvolver o assunto que escolhi para este post, aí vão alguns dados. Fui criada numa família religiosa. Seguimos, a grande maioria, o Evangelho Quadrangular. Somos orientados pela Bíblia e tiramos dela mensagens importantes, que tocam nossos corações. Não somos cegos, não somos massa, usamos a religião para nos sentirmos acolhidos, mais perto do pai.

É engraçado, sempre que digo que vou à igreja as pessoas me olham com uma cara de dúvida. Tu?!?! Sim. Eu. Hoje, parece que ter religião é careta, cafona, coisa de gente sem instrução. Acho que por isso estranham minha escolha. Não me considero careta, tenho tatuagens, piercing, um cabelo esquisito, falo sobre tudo, saio com meus amigos, faço festas, viagens, estou terminando a faculdade e tenho mais um monte de cursos no currículo. Pode-se dizer que sou uma “adolescente-adulta” normal. Não é falta de instrução, é uma necessidade.

Ter uma religião para mim, ir à igreja, é, no meio de toda correria de uma semana, reservar um momento para olhar para dentro. Infelizmente, sozinha, longe da igreja, esse momento acaba sempre ficando para depois. O culto é uma forma de me comprometer comigo. Olhar para dentro não é fácil. Muitas vezes, a gente prefere errar e, olhando para fora, culpar o outro das nossas próprias falhas.

Com tanta violência, mentira, agressão, violação lá fora, nesse mundo doido que vivemos, é olhando para dentro e um pouco para cima, que busco as energias necessárias para seguir, para traçar meu caminho. Alguns caminham sozinhos, cheio de si, de razão. Faço isso, mas preciso sentir que alguém olha meus passos, que alguém, algo, algo maior que eu, que tudo, caminha ao meu lado.

Logo que me mudei para Porto Alegre, a correria foi tanta que acabei caminhando do jeito que dava. Posso dizer que não cometi tantos erros, essa força superior, que eu chamo de pai, seguiu ao meu lado, mas faltava que eu estivesse ao lado dela. A religião para mim é como uma família, a gente não precisa morar junto, morar perto, mas a gente precisa regar o laço, renovar o laço.

Hoje, de volta, vendo a minha vida mais animada, mais positiva, mais no rumo que gostaria que ela estivesse, vejo que falta estar longe me fez.

“Se às vezes me escondo, em você me acho
Nem dá pra disfarçar Preciso dizer:
você faz muita falta Não há como explicar…
Foi sem você que eu pude entender
Que não é fácil viver sem te ter
Meu coração me diz que não
Eu não consigo viver sem você”.